Diego Ortiz
“Não sei se você acredita nesse ditado, mas eu falo pra você, que é real: você colhe o que você planta. Se você plantar o bem, você vai colher o bem. Acredito muito nisso”. Esta foi a reflexão do motoboy Ronaldo Calciolari Lopes, de 43 anos, que comprovou a força do ditado popular na sequência de duas semanas. Depois de encontrar uma carteira com R$ 8.950,00 em cheques em plena rua na madrugada de domingo retrasado, conseguiu localizar o proprietário e efetuar uma emocionada devolução.
Exatamente uma semana depois, na madrugada do domingo passado, perdeu o molho de chaves, incluindo o de um local de trabalho, ficou desesperado, mas, desta vez, foi o beneficiado: teve a sorte de alguém encontrar os objetos para devolvê-lo.
A carteira foi encontrada por Ronaldo depois de uma cansativa noite de trabalho. O motoboy voltava da lanchonete onde trabalha no bairro Santa Cruz, por volta de 0h, e, no trajeto para casa, passando pela Avenida Brasil, acabou localizando a carteira com os cheques pré-datados e uma pequena quantidade em cédulas. A quantidade de dinheiro era pouca, com notas de R$ 2 não chegando a totalizar R$ 10. Já em cheques, havia três folhas de R$ 2 mil, quatro de R$ 500 e uma de R$ 950. “Eu vi que tinha uma carteira no chão, tudo escuro, Deus mandou passar naquela hora e naquele lugar. Parei mais pra frente, olhei a carteira e vi que tinha um tanto de dinheiro e um tanto de cheque”, conta Ronaldo.
Pela carteira de habilitação presente na carteira, onde também havia um cartão de crédito, descobriu que o proprietário era da cidade de Presidente Prudente. Cansado, chegou em casa com a carteira e foi dormir. Na segunda-feira, foi para a estrada em seu trabalho como vendedor. Quando retornou, à noite, resolveu descobrir uma maneira de encontrar o dono. Como não entende muito de redes sociais, teve a ajuda da irmã, que, na terça-feira pela manhã, acessou a Internet e viu uma postagem da esposa do dono da carteira informando que estava procurando o objeto perdido. “A foto que a esposa dele pôs no Facebook era a mesma que tinha na carteira. Eu falei: é ele, é dele mesmo. Aí, eu não tive dúvida. Minha irmã entrou em contato com ela. Aí ela explicou que faz uma semana que eles estão morando em Mogi Mirim, eles vieram embora de Presidente Prudente”, detalha Ronaldo.
Então, na terça-feira, Ronaldo foi encontrar o dono da carteira em frente a um restaurante do Centro da cidade, onde o recém-chegado a Mogi Mirim realiza um serviço como pintor e estava pintando a parte externa. “Ele ficou feliz da vida. Ele já largou o serviço, já veio me cumprimentar, me parabenizou pela atitude. Ele falou: só um minuto. Ele foi lá pra dentro, a hora que voltou, me deu R$ 100. Ele falou: é pouco, mas é de coração. Eu falei: pô, mas não precisa. Ele falou: não, não. Aí ele agradeceu muito: poucas pessoas fariam isso, parabéns”, relata, contando ter se sensibilizado com a gratificação. “Foi o R$ 100 mais gratificante que já ganhei na minha vida, pelo fato de devolver para a pessoa certa e a pessoa reconhecer também”, destaca.
Perguntado sobre o que faria com o dinheiro da gratificação, Ronaldo contou ter utilizado para completar o pagamento do aluguel onde reside. “Eu pago R$ 500 de aluguel na minha casa, menos 100, eu paguei quatrocentão. Acabou me ajudando em outra coisa”, comemora.
DINHEIRO
Perguntado se teria devolvido se fosse cerca de R$ 9 mil em dinheiro, respondeu que agiria da mesma maneira. “Com a situação que tá todo mundo passando, às vezes, a pessoa que perdeu está numa situação mais difícil ainda, né? Com certeza, eu devolveria também, se eu conseguisse achar a pessoa certa, porque a gente faz o bem pra receber o bem”, afirma.
“Não tem coisa mais gratificante do que achar o dono do negócio e falar: ‘tá aqui, oh, é seu’. Só de você ver a reação da pessoa ficar feliz é maravilhoso”, relata Ronaldo (Foto: Arquivo pessoal) |
‘Abençoado’, Ronaldo já encontrou carteiras de diversas pessoas
Esta não foi a primeira vez que Ronaldo Lopes encontrou uma carteira na rua. Em uma das ocasiões, devolveu uma carteira com uma pequena quantidade em dinheiro, entre R$ 15 e R$ 20. Não recebeu gratificação até pela pequena quantia, mas também nem estava preocupado com este fator. “Não vou atrás da gratificação, vou atrás de devolver mesmo pra pessoa, porque a gente tem que se colocar no lugar da pessoa. É difícil uma coisa que é sua, você perder, é difícil”, frisou.
Em outra oportunidade, achou uma carteira com documentos, sem dinheiro, e conseguiu devolver ao dono. Em outra, deixou a carteira na delegacia. “Eu sempre tento procurar, achar a pessoa certa que é dona do negócio. Mas quando não consigo, eu levo na delegacia, que acho que é o lugar mais seguro que tem”, comentou.
Perguntado se acredita ser alguma espécie de sorte ou se é muito atento, respondeu acreditar ser uma pessoa abençoada por Deus: “Eu não fico caçando, mas parece que alguma coisa me puxa praquilo, eu não fico procurando, parece incrível, alguma coisa me puxa praquilo. Você tá pensando em outras coisas, você bate o olho, meu Deus, olha ali”.
Questionado, então, se acredita ser uma pessoa iluminada e que as situações acabam se projetando para que ele possa ajudar, respondeu afirmativamente. “Acho que sim, porque certas pessoas pra quem eu falei que isso aconteceu, falaram: você é tonto, por que você não pegou o dinheiro? Eu falei, mas não é meu, pô. Às vezes, a pessoa que perdeu está precisando muito mais do que eu. Deus me deu força pra correr atrás”, salientou.
Caso tivesse má intenção e depositasse os cheques em sua conta, Ronaldo deixaria rastros. Além disso, os cheques já poderiam estar sustados e a tendência, em caso de depósito, seria a devolução. Caso tentasse passar os cheques no comércio, poderia ter dificuldades pela identificação. Mas, ainda assim, se tivesse o objetivo de levar vantagem indevida, poderia tentar aplicar golpes passando as folhas para frente. Nada disso passou por sua cabeça, mas poderia ter passado pela de pessoas más intencionadas caso estivessem de posse dos cheques.
Perguntado sobre o que os críticos de sua conduta o aconselharam a fazer com os cheques para levar vantagem indevida, Ronaldo disse ter preferido encerrar o assunto logo no início das repreensões. “Na verdade, eu nem procurei saber, só de começar essa conversinha, já não serve nem pra continuar a conversa. Porque não é minha intenção, não quero nem saber como vai fazer, já falou uma coisa que não me pertence, não preciso escutar o resto”, refutou.
Porém, disse que a maioria das pessoas que souberam ficou muito feliz e admirada com a atitude. “Teve uns que criticaram, mas a maioria falou: cara, você é um cara iluminado mesmo”, celebrou.